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Viver o infinito


O grande problema de se viver sem a eternidade na consciência e no coração é o que decorre da própria natureza do mundo material. Este possui uma fragilidade imensa. Tudo nele possui tamanha transitoriedade que fica difícil se interessar pelas suas coisas quando se medita em sua realidade concreta. Tudo é mudança, e a cada momento forças diversas movimentam tudo, alterando lugares e circunstâncias.


Em algumas poucas coisas e por sequências limitadas de instantes (podem durar anos, às vezes) conseguimos ter algum controle sobre processos, mas logo este se perde. Há limites nos planejamentos, limites materiais e temporais. A ideia de que podemos tudo dominar é absurda, e contrária à natureza do universo. A gestão de riscos é a mais difícil e irracional etapa da elaboração de qualquer projeto. Pois riscos são infinitos e, na verdade, imponderáveis.


Como as causas dos eventos, no mundo material, são incontáveis, chega a ser incompreensível o surgimento da ilusão de dominar as circunstâncias de forma segura. O próximo, eu, minha conjuntura, tudo, a considerar apenas causas materiais, é estabelecido por casualidades conhecidas e desconhecidas. Logo nos damos conta que nenhuma circunstância foi, de fato, controlada. E a nossa própria tentativa de tentar estabelecer controle é uma dessas infinitas causas concretas, mas usualmente não é determinante. Por isso o local em que estamos é o único lugar em que podemos estar. Surge de conjugação de fluxos incontroláveis. Não temos real controle sobre o que aqui ocorre.


Apenas as nossas decisões podem fazer a diferença, se são decisões que buscam transformar o caos em ordem. Mas isso se estão atreladas a uma percepção de que emergem de algo maior que este mundo material, se estão ancoradas numa imaterialidade que permite o entendimento de que este tumultuado universo caótico possui um sentido que transcende seu caos e de que algo eterno o pode explicar. Aí a transitoriedade e o caos, embora continuem a se-lo, deixam simultaneamente de se-lo, ao conter, na sua vivência, a realidade de um sentido imaterial de ordem e imortalidade.


A percepção da realidade desse tipo de sentido imaterial é universal, embora a sua precisa verdade encontre muitos obstáculos nas culturas e nas sociedades para ser vivida. Em grande medida porque viver a transitoriedade absoluta da matéria é doloroso, mas também prazeroso. O ser e o não ser, o ter e o não ter envolvem a consciência num ciclo infinito de necessidades e perdas que mobilizam as energias continuamente, contraindo e relaxando as vontades e os sentimentos. Para muitos isso é bom e ruim, mas harmoniza a consciência com um certo movimento da matéria.


Mas a percepção da eternidade (e aparentemente só os humanos a têm integralmente, com todas suas consequências), que é real, no âmbito da experiência religiosa, nos sinaliza um outro vínculo, que a Fé estabelece com consistência, não com a finitude do mundo, mas, sim, com o infinito que a este explica e supera.




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